sábado, 28 de julho de 2012

Auxílio-reclusão não é 'bolsa-bandido', diz a advogada Ana Cleide Cruz

O acesso à internet e as redes sociais democratiza a informação. Pessoas outrora adstritas a pequenos círculos de convivência e comunicação agora podem colher informações de todo tipo e de toda parte. Igualmente, podem divulgar suas ideias e opiniões, o que é bom, mas gera algumas aberrações na medida em que estas opiniões carecem de conhecimento de causa.
A frequência com que tenho visto comentários equivocados e distorcidos acerca do Auxílio-Reclusão Me motiva a escrever a respeito.
Antes o tema era amplamente propagado via e-mail, agora é a vez do facebook onde pessoas esclarecidas postam links trazendo, em meio a um discurso inflamado, muitas vezes agressivo, as mesmas informações equivocadas; inclusive se referindo ao auxílio-reclusão como “bolsa-bandido”.
É muito comum ver as pessoas postando, indignadas, que se paga a cada filho de presidiário a importância de R$ 915,05 por mês. Argumentam que, dessa forma, há um incentivo à criminalidade e que acaba sendo mais vantajoso estar preso do que ter que trabalhar para prover o sustento dos filhos. Em regra, efetuam cálculos para verificar a suposta renda mensal de um presidiário cuja família seja numerosa, num inevitável comparativo ao salário pago à maioria dos trabalhadores brasileiros.
Independente da origem e a quem interessam tais comentários, o fato é que não correspondem com a verdade. A fim de cessar a propagação equivocada à cerca desde benefício é necessário entendê-lo. Então vejamos:
O auxílio-reclusão é um benefício previdenciário previsto na Constituição (art. 201, IV) e no art. 80 da Lei 8.213/91, concedido aos dependentes do segurado de baixa renda que tenha sido preso e não receba nem auxílio-doença, nem aposentadoria, nem alguma remuneração da empresa na qual trabalhava.
Na verdade, existe uma série de detalhes que são levados em consideração para a concessão do auxílio-reclusão, mas o mais importante é que este benefício é concedido somente aos dependentes do presidiário que possuir a qualidade de segurado da Previdência Social à época de sua prisão. Ou seja, é necessário que o preso mantenha vínculo com o INSS. E isso se dá por meio de contribuições, as quais – utilizando-se de linguagem extremamente simples – ocorrem através da carteira de trabalho assinada, no caso do empregado; de Guias da Previdência Social, em se tratando de contribuintes individuais (como profissionais autônomos, por exemplo) e segurados facultativos; e do bloco de produtor rural para quem é agricultor na condição de segurado especial.
Em resumo, pode-se dizer que o auxílio-reclusão é concedido aos dependentes do trabalhador que contribui ou contribuiu para a Previdência Social dentro de determinado período (Período de Graça).
Com isso, fica claro que não basta ser preso para que o benefício seja concedido, é necessário, dentre outros requisitos, que o preso mantenha a qualidade de segurado do INSS.
Não se exige que o trabalhador esteja contribuindo no momento do recolhimento à prisão, mas, exige-se que não tenha transcorrido mais do que determinado período a partir da data da última contribuição. Período que pode variar de acordo com as peculiaridades de cada caso(até 4anos)
Também é necessário que o último salário de contribuição do segurado (vigente na data do recolhimento à prisão ou na data do afastamento do trabalho ou cessação das contribuições) não ultrapasse o valor estipulado por Portaria Ministerial. A partir de 1º de janeiro de 2012 esse valor é de R$ 915,05, conforme Portaria nº 02, de 06/01/2012. Mas, não significa que todo o auxílio-reclusão é pago neste valor. Este se refere ao teto, ao máximo que pode ser pago. Se o segurado ganhar (em atividade) mais que isso já perde o direito ao benefício.
Para cada caso se realiza um cálculo considerando as contribuições efetuadas pelo segurado (leva em consideração os 80% maiores salários desde julho/94), para então, definir-se o valor do auxílio-reclusão aos seus dependentes. Porém, em nenhuma hipótese o auxílio-reclusão pode ultrapassar o valor estipulado pela referida portaria, já que é pago justamente para os dependentes do segurado preso de baixa renda.
Salientando-se que para os agricultores enquadrados como segurados especiais, o auxílio-reclusão é pago no valor de um salário mínimo mensal.
Ademais, o valor fixado para o auxílio-reclusão (que, como vimos, varia caso a caso), e é dividido em partes iguais entre todas as pessoas que se enquadram como dependentes do segurado preso. Ou seja, há um rateio do benefício entre os dependentes e, não, o pagamento de um benefício em valor integral para cada um deles, como erroneamente se tem divulgado, causando revolta e indignação às pessoas de bem que não conhecem o ordenamento legal.
A continuidade do pagamento deste benefício está condicionada à manutenção das condições existentes no momento de sua concessão. Os beneficiários deverão apresentar ao INSS, de três em três meses, documento expedido por autoridade competente atestando que o trabalhador continua preso, enfim, informando sua situação atualizada.
Dentre as situações que acarretam a cessação do benefício está a fuga do presidiário.
Diante do exposto, pode-se perceber que o auxílio-reclusão não é tão simples de ser concedido, pois requer o preenchimento de determinados requisitos, e um deles é a manutenção da qualidade de segurado do INSS por parte do preso, situação que não é comum acontecer, eis que a grande maioria dos presos não possui qualquer vínculo com a Previdência Social, não tendo, seus dependentes, por consequência, direito ao benefício.
O INSS é uma “seguradora social”, seu objetivo é proteger, socorrer seus segurados em momentos de sinistro, como morte e doença, por exemplo. O mesmo ocorrendo em casos de prisão. Por isso, para fazer jus ao auxílio-reclusão, não basta simplesmente ser preso, é necessário, assim como ocorre com todos os demais benefícios previdenciários tais como aposentadoria, pensão por morte e auxílio-doença que para tê-lo deverá preencher os requisitos legais.
Então, por ser um seguro, na verdade o preso que recebe o auxílio-reclusão não está recebendo nada além do que aquilo pelo qual já pagou. Logo, não se trata de um gracioso favor prestado pelo governo, mas sim o pagamento daquilo que estava antecipadamente previsto na legislação.
Assim, se é justo ou injusto o auxílio-reclusão, fica a critério de cada cidadão fazer suas próprias considerações. Contudo, seria interessante a reflexão de um caso hipotético:
Imaginemos que um cidadão que conhecemos e sabemos ser um pessoa correta, trabalhadora com esposa (que não tem renda) e 5 filhos é injustamente acusado de um crime e recolhido à prisão deixando sua família desprovida de qualquer possibilidade de sustento, estando trabalhando ou tendo trabalhado e ainda em período de graça, sua esposa possa habilitar o benefício e garantir o recebimento de mensal garantindo assim a provisão do lar, ou ainda, mesmo que está pessoa tenha se corrompido, seja de fato culpado o benefício visa resguardar o sustento de seus dependentes.
Por fim só para desmistificar essa idéia que o INSS é uma mãe, pois diferente da Assistência Social a Previdência é um seguro, logo, como já dito: SÓ TEM QUEM PAGA!
Por óbvio, nada contra discutir se é o melhor para a sociedade brasileira que esse benefício exista, mas pelo menos devemos nos pautar pelo que efetivamente está previsto, e não por um conceito imaginário do que seria o benefício

Nenhum comentário:

Postar um comentário